Você certamente já deve ter ouvido por aí que sonhos não envelhecem, certo? O cantor Wilson Grassi é prova disso! Aos 51 anos, o ex-médico veterinário, que abandonou a profissão onde atuava há mais de duas décadas, se encontrou no samba e acaba de lançar o single “Samba das Religiões” em todos os apps de música.
Formado em medicina veterinária e atuante na área por mais de 25 anos, Wilson Grassi conta que sempre amou a profissão, mas que chegou em um momento de sua vida que sentiu falta de sentir outro tipo de realização. O artista também revela que sempre teve vontade de ser músico, mas que foi no Cavaquinho que encontrou o caminho para a realização de seus sonhos.
Composta por Wilson Grassi em parceria com Jeh Pássaro “Samba das Religiões” fala sobre a diversidade e a importância da tolerância religiosa no Brasil. Confira a entrevista!
Você recentemente lançou o single “Samba das Religiões” que fala sobre as diversidades e importância da tolerância religiosa no Brasil. Diante de tanto preconceito evidenciado no país, qual é a mensagem que você deseja passar com essa canção?
Falar principalmente de liberdade e diversidade e de respeito que cada um tem o direito de escolher o seu caminho, e todos esses caminho são corretos e tem que ser respeitados.
O que te levou a seguir seu sonho de ser cantor aos 51 anos?
Durante 25 anos, eu me dediquei à medicina veterinária, trabalhei como clínico, fiz muito plantão, trabalhei como cirurgião, fiz muita cirurgia, e depois trabalhei na parte de administração de clínicas veterinárias. Comecei com uma clínica, cheguei a ter 13 clínicas, montei um plano de saúde. Penso que dentro da minha carreira veterinária, tudo que eu me propus a conseguir, penso que eu consegui e me sinto satisfeito. O que eu tinha para conquistar conquistou e eu achei que era a hora de respirar novos ares, fazer uma coisa, seguir uma profissão que me trouxesse mais felicidade e mais desafios, que fosse mais leve, que me trouxesse novos amigos, que me trouxesse novos prazeres, aí resolvi sair totalmente da minha praia interior e estou numa praia nova agora, que a música.
Como você espera ser recebido na carreira artística?
Estou pisando devagarzinho que nem a música — tô pisando devagarzinho, tô olhando, tô vendo qual que é, onde que eu tô chegando, onde que eu tô pisando com muito respeito e com muita humildade. O que vier, será bem-vindo, porque tipo, o que eu tô buscando mais é o prazer do caminho. Eu não tô querendo chegar em algum lugar, eu tô querendo curtir o caminho, e é o que eu tô fazendo e está sendo muito gostoso.
Conte-nos um pouco mais sobre quem é Wilson Grassi.
Wilson Grassi é um brasileiro, o que por si só, já diz muita coisa, porque o Brasil não é para amadores, é para profissionais. Então, sou brasileiro acostumado com as adversidades e não tenho compromisso com um único caminho. Sou um cara que me permito renovar a cada dia. Esse agora, ainda mais depois que fiz 50 anos, acho que agora acabou um ciclo e tenho que começar outro. Estou morando numa casa nova, tenho novos amigos, embora eu mantenha os antigos, tenho uma nova carreira, então quero experimentar tudo que a vida tiver para me dar. Então, isso é Wilson Grassi,um cara que de hoje em diante, quer experimentar e viver várias vidas em uma só, porque vai saber se tem outra. Na dúvida é melhor a gente viver todas agora.
Muitas vezes escolhemos uma profissão por causas de influências externas, e nas demais por escolhas próprias. A veterinária e os palcos são pontos que apesar de muito afastados acabaram se juntando em sua vida. Como foi essa fusão e como a música foi tomando conta de sua vida profissional?
Tenho uma história meio louca aí que me afastou da música por 25 anos. Quando eu tinha 20 e poucos anos, no meu primeiro casamento duro, eu estava lá no domingo tocando violão sem R$ 1 real no bolso e a minha ex-mulher da época queria que eu fosse comprar um frango assado e uma Coca-Cola, e eu não tinha dinheiro para comprar o frango e a coca-cola. Ela falou que eu não tinha dinheiro para comprar um frango assado e estava tocando violão. Ela tomou o violão da minha mão e bateu com ele no chão despedaçando-o e falou que tocar violão é para quem estava com as contas pagas. Acabei me separando dela não por isso, mas por outros motivos, mas fiquei com essa história de que tocar violão era para quem estava com as contas pagas. Vinte e cinco anos depois, olhei para o lado e falei: “Poxa! Não é que estou com as contas pagas agora.” — Fui lá e comprei um violão, larguei a veterinária e abracei a minha carreira.
Depois dessa trajetória de 20 anos na medicina veterinária, recebemos a pouco tempo o single “Samba das Religiões” que aborda a diversidade e a importância de se cultivar a tolerância religiosa. Muitos artistas buscam se inspirar em situações vividas durante suas experiências e relatos de vida. O que o levou a desenvolver um tema tão complexo e ao mesmo tempo bastante discutido no cotidiano de tanta gente?
Você falou uma palavra que é muito comum hoje em dia da gente ouvir falar na tolerância, mas sabe que fico meio — “será que a palavra tolerância se encaixa bem?” — porque tolerar meio que relembra a gente ter que passar por cima de alguma coisa. Eu penso que não tem nem que ser tolerado porque é o caminho de cada um. Não faz sentido o outro indivíduo tolerar o caminho do um, porque, simplesmente não é da conta do outro o que um faz com a própria vida. A música fala que cada um tem que escolher o seu caminho, mesmo que o caminho seja nenhum, e talvez o nenhum caminho, seja um caminho e talvez o meu caminho, seja o nenhum caminho, porque, eu também, como se diz no futebol, já flutuei por diversas religiões — bem coisa de Brasil — já flutuei por várias e não me fixei em nenhuma. Então talvez o meu caminho não seja de nenhuma. Isso tudo começou a rodar na minha cabeça, e falei vou tentar fazer um sambinha aí que prega a liberdade e a diversidade religiosa, e saiu “Samba das Religiões”. Fiz a letra e o meu parceiro Jeh Pássaro contribuiu decisivamente com a melodia.
O Brasil é conhecido por ser berço de uma grande mistura de crenças e costumes, sejam eles religiosos ou regionais, um lugar onde diversas religiões realmente se encontram em um único cenário. Para você, qual é a melhor qualidade de conviver com o povo brasileiro e qual é a sua maneira de observar o cotidiano dessa grande mistura que se torna uma só?
O povo brasileiro é um povo que, por incrível que pareça, é um povo feliz. Parece que quanto mais sem grana o cara, quanto mais duro, mais feliz ele está. Você observa as festas populares e situações culturais com uma roda de samba que tá todo mundo feliz, às vezes com uma cerveja de R$ 5 reais em cima da mesa e até com a dose de pinga de R$ 1 real. O brasileiro está feliz, se não tem um instrumento sofisticado, ele está batucando na mesa. O brasileiro é um povo alegre, e é muito gostoso observar isso principalmente frente a outros povos que são mais ricos financeiramente, mas que não tem essa alegria que o brasileiro tem. A gente só lamenta que esse tipo de alegria não se traduza numa organização social que possa mitigar as mazelas da nossa sociedade, mas, nem sei se adianta mais falar isso depois de 500 anos, que a coisa não está dando certo do ponto de vista social, mas pelo menos do ponto de vista artístico, musical e cultural, nós como brasileiros, temos muitos motivos para sermos orgulhosos.
Durante sua atuação na área médica, o senhor teve um momento em que sentiu a necessidade de buscar outro tipo de realização, além de sempre ter tido vontade de ser músico. Foi difícil tomar a decisão de trocar a carreira na veterinária para os singles?
Por incrível que pareça, não foi difícil largar a medicina veterinária. A medicina veterinária tem uma coisa extremamente pesada que é a morte e conviver com ela. Se você trabalha em um consultório pequeno, você vai perder um paciente raramente. Se você é um dermatologista, talvez nunca perca um paciente. Mas, se você trabalha em um hospital, trabalha no setor de internação, trabalha como um cirurgião, você convive com a morte muito de perto. Em um hospital movimentado, você convive com a morte todos os dias. A morte muitas vezes acaba com o sofrimento de um animal, mas produz um sofrimento na família que o perdeu. Eu sempre tive muita dificuldade de aceitar isso, de aceitar perder um paciente e de conviver às vezes com o sofrimento de uma criança que leva o cachorro, que é o seu melhor amigo com uma doença que às vezes é incurável. Eu achava que até um certo ponto era o meu destino. Eu estava preparado tecnicamente para isso e seguir, mas quando eu entendi que a minha missão estava cumprida, eu me organizei financeiramente dentro desse período e falei: “Não. Agora é a hora de abrir as asas e voar.” — soltar o que eu estava carregando até aquele momento e não fiz isso com muita dificuldade emocional. Foi a dificuldade de quem solta umas malas que estava carregando e passa a andar muito mais leve, e um sentimento também de uma missão cumprida. Eu penso que cumpri a minha missão. Eu acho que tive sucesso na veterinária, ajudei muitos animais, ajudei a abrir os primeiros hospitais públicos do Brasil que já atenderam gratuitamente mais de um milhão de pessoas. Eu tenho pacificado no meu coração que fui importante para a proteção dos animais e para coisas que foram muito úteis para eles e para suas famílias. Estou com um sentimento de missão cumprida e estou batendo asas para outros lugares.
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