Chegar ao topo é o sonho de qualquer artista. E Cássia Raquel pode dizer que conseguiu. A cantora é uma das estrelas de ‘Alegria’, famoso espetáculo do Cirque Du Soleil. Nascida e criada no Rio de Janeiro, começou a carreira na música cedo, sendo uma das finalistas do programa “Ídolos” (2008), RecordTV. Possui diversos sucessos lançados nas plataformas digitais, e atuou em musicais famosos, como ”Hair” e “Les Misérables”.
Uma das peculiaridades do circo se deu no processo de seleção. Todo o teste foi feito de forma virtual. Além disso, diferente do musical tradicional, no qual o teste é feito para um papel ou espetáculo específico, no circo é feito de forma mais branda, para criar um banco de dados. A grandiosidade dos espetáculos torna a experiência única. Das roupas à voz, das acrobacias à atuação, é tudo mais extremo. Por isso, a voz se torna a principal ferramenta. A música também tem um papel diferente do incomum no Cirque Du Soleil.
‘Alegria’ é um espetáculo com forte cunho sociopolítico, que apresenta o fim do conservadorismo e o começo da renovação, que faz parte da vida pessoal da cantora. Ser a única mulher preta do elenco mostra como esse processo de renovação ainda está no início. Confira a entrevista:
Tendo começado sua carreira na música bem cedo, você foi uma das finalistas do programa ‘Ídolos’ em 2008 na Record TV. Vendo toda essa trajetória até aqui, o que mudou da Cássia do início para a atual?
A Cássia do ‘Ídolos’ e a Cássia de hoje são completamente diferentes. Hoje eu tenho uma maturidade maior, principalmente graças as diversas experiências, seja na tv ou no teatro. Foram elencos e produções diferentes, e cada um me ajudou e me formou a pessoa que sou hoje. Atualmente eu tenho uma noção maior das melhores oportunidades pra mim e pra minha carreira.
Fora que esse tempo me fez ter mais consciência dos meus limites, e isso é fundamental. Hoje tenho uma maturidade maior sobre minha voz, minha técnica, e isso me permite me jogar em outros personagens ou encarar demandas maiores. Outra questão é encarar as críticas com mais consciência, não levar pro coração qualquer coisa que eu ouço e encarar os preconceitos. Então esse amadurecimento me ajuda a ser muito consciente com meu corpo, minha técnica e minha carreira.
Como uma das estrelas de ‘Alegria’, famoso espetáculo do Cirque Du Soleil, qual é o sentimento que passa na mente diante dessa conquista? E como os seus fãs têm recebido essa novidade?
Meu sonho sempre foi viajar o mundo, e na minha infância isso era algo muito distante. E conforme eu fui conhecendo novos trabalhos e pessoas, vi que isso era possível. Quando assisti um espetáculo do circo no Brasil, o “Corteo”, me acendeu isso. Até me deu um receio, de viver uma vida nômade, ficar longe da família, não ter um lugar fixo. Mas quando vivenciei isso, percebi que foi exatamente o que eu precisava. Estou vivendo o melhor momento da minha vida, trabalhando e viajando, unindo o útil ao agradável.
E algo marcante foi conversar com brasileiros que assistiram a versão antiga, e falam como é emocionante ter uma brasileira nessa nova versão. Então não apenas os fãs, mas a galera que está conhecendo agora, então tem sido uma emoção mútua. E acho que toda alegria compartilhada é muito boa. Poder representar um país, representar uma classe. Não é uma vitória só minha, é de todo um grupo, então ta sendo sensacional. E quando anunciei pro público, foi uma festa geral!
Qual é o maior diferencial dos trabalhos na qual você realiza para o estilo levado no Cirque Du Soleil?
Poder conviver com várias culturas. Eu já fiz trabalhos que vieram de fora do Brasil, que tive contato direto com pessoas de outras culturas, mas era algo limitado aos ensaios, então a gente abrasileirava tudo ao longo da temporada. E agora não, aqui a gente se adapta a tudo, uma hora estamos falando inglês, aí na outra francês, ai depois português, então tem essa diversidade. E a gente passa por cidades bem cosmopolitas, então a passa a conhecer múltiplos universos, cozinhas diferentes. E no Brasil as pessoas costumam ficar mais uma certa área, e aqui não, então aqui tem pessoas que trabalharam nas olimpíadas, por exemplo. Então tem esse multiverso, e é genial.
Você interpreta ‘Singer in Black’, personagem determinada e poderosa. Qual é a semelhança dessa personagem com Cássia Raquel?
Essa personagem caiu como uma luva pra mim. Ela é muito parecida comigo na força, mas ao mesmo tempo tendo uma doçura, é como se eu estivesse me olhando no espelho. E eu amo tudo no personagem, as características das músicas que são mais graves, que dá uma certa imponência pra ela, o figurino que, mesmo com a predominância do preto, me lembra muito o carnaval, nas cores e nas plumas. Tem muito brilho, o cabelo pra cima, as cores, então mostra toda a diversidade que tem em mim. Eu sou brasileira, eu amo o carnaval, a música.
Ela é uma líder, e ela consegue captar as mensagens apenas no olhar, sem ser agressiva. E na final ela se une a Singer in White, e todos vivem em harmonia. É um personagem que eu não me cansaria de fazer, e está sendo super prazeroso.
Além de “Alegria”, você também já fez vários clássicos como “Hair” e “Les Misérables”, original do autor Victor Hugo. Como é a responsabilidade e o preparo para reviver personagens tão aclamados e eternizados pelo público, como foram nesses casos?
O ‘Hair’ foi especial, não apenas por ser meu primeiro trabalho profissional no teatro musical, mas porque tive todo o suporte da produção e da direção. Então posso falar que foi “fácil” viver esses personagens, porque tive todo o apoio que precisava. Foram duas semanas de workshop pra entender tudo sobre a história, os personagens, e eu fui me apaixonando cada vez mais. E eu fui inserida muito bem naquele elenco, então a gente tava no mesmo clima, no mesmo propósito.
E o ‘Les Misérables’, por ser uma franquia, a gente não tem a oportunidade criar tanto, mas sempre tem uma gotinha, sempre tem uma dose (rs). Eu era substituta das duas personagens principais, então eu tentava encaixa-las na minha realidade, no meu perfil vocal. E isso é um trabalho interno, de criar essa identidade e transformar algo novo.
Uma das curiosidades que soubemos, foi que o processo de seleção do Cirque Du Soleil foi realizado totalmente de forma virtual. O que você sentiu na hora de realizar esse processo e como foram os critérios dos avaliadores?
Foi a única seleção que eu fiz 100% virtual. Eu me inscrevi pro casting há anos atrás, então eu coloquei vídeos que pudessem mostrar o meu talento. E tentei ser a mais verdadeira possível. Acho que talvez a maior dificuldade foram os prazos, e não saber com quantas pessoas eu estava concorrendo. Mas acho que isso foi algo benéfico. Essa incógnita, esse mistério, deixa as coisas mais emocionantes. Todo o processo foi rápido, preciso. E eles sempre foram muitos gentis nas suas respostas, seja o sim ou o não, então isso me animou bastante.
Falando um pouco sobre magia, nós sabemos que todo espetáculo ou produção artística possui a sua própria e que todas têm formas bem especiais e únicas. O que mais a encanta no dia a dia da profissão que você decidiu escolher e qual considera ter sido seu maior momento?
A maior magia que a arte proporciona é fazer as pessoas esquecerem um pouco a realidade tão dura. Essa pandemia mostrou que ninguém consegue viver sem arte. A arte faz as pessoas respirarem, voltarem a sonhar, rir, chorar e perceber que tem tanta coisa linda para se viver. E isso a gente consegue fazer através da dança, da música, de um gesto. E como o musical tem tudo isso misturado, essa emoção fica maior.
Eu pude fazer musicais que contam histórias verdadeiras, marcantes, e como a gente não pode voltar no tempo, o teatro proporciona isso, dá as pessoas essa visão, e permite que elas se emocionem. E a minha profissão eu posso embalar qualquer momento, então mesmo em momentos mais triste, eu posso deixar as pessoas mais tranquilas. E eu acho que isso é o mais mágico, fazer as pessoas olharem o mundo com essa visão mais leve.
Acho que o maior momento da minha vida tenha sido no Prêmio Cesgrandrio, o último que teve antes da pandemia. Eu pude homenagear uma mulher preta (Ruth de Souza) que abriu as portas pra nós, e cantar uma canção que tem muita representatividade, e as pessoas entenderem e aplaudirem isso. E no dia do prêmio eu estava cantando o que eu vivo todos os dias. A minha militância é uma luta diária, então ali era eu mesma, e acho que esse talvez seja o momento mais único da minha vida.
Em sua autoavaliação, o que torna Cássia Raquel uma pessoa única dentro das produções?
Serenidade. A gente está em um período de correria, e eu acredito que quando a nossa presença é calma, a gente passa isso para as pessoas. E eu quero passar essa plenitude. E o teatro é um trabalho muito instável, porque a gente trabalha por temporada, então existe sempre uma ansiedade. Então quanto mais serenidade eu tiver, eu consigo trabalhar melhor, e acho que esse é meu maior diferencial. Esse autocontrole faz com que eu me divirta em cena, que eu decore as coreografias. E a gente precisa manter essa energia em alta, porque depende da gente transmitir isso pra plateia.
Crédito fotográfico: Iara Watney Pires
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