Após 29 anos afastado dos palcos, o ator veterano, Ruben Pignatari retorna à cena com a peça “O Sonho Americano”, um convite de Luiz Carlos Checchia que o deixou extasiado. O texto, que aborda questões relevantes do Brasil contemporâneo, despertou nele uma nova paixão pelo teatro, mesmo diante do desafio de se reconectar com suas habilidades após tanto tempo longe. “Foi um grande desafio, mas a proposta do texto me inspirou a aceitar”, relata. Durante o processo de ensaio, o ator destaca a importância da paciência e orientação do diretor, que o ajudaram a reconquistar a confiança e a desenvolver seu personagem.
O personagem que o ator interpreta é complexo, apresentando facetas de agressividade e humor, além de uma dinâmica especial com os outros personagens da peça, especialmente Beatriz e Bento. “É um homem de caráter duvidoso que sente prazer em torturar psicologicamente”, explica o ator, enfatizando a importância de sua atuação em um contexto que aborda a ditadura militar e suas consequências. Para ele, a responsabilidade de interpretar um papel tão impactante é grande, pois acredita que é fundamental que os jovens compreendam a gravidade desse período histórico. “Que o meu personagem possa lhes dizer: DITADURA NUNCA MAIS!”, declara.
A peça não é apenas um retorno ao palco, mas também um convite à reflexão sobre o passado e as repercussões na sociedade atual. O ator espera que o público saia da montagem com a consciência de que o fascismo não deve ter espaço em nossa sociedade. Ao longo de sua carreira, que inclui passagens pela TV Tupi, cinema e diversas produções teatrais, ele reflete sobre como cada meio contribuiu para sua formação como artista, destacando sempre o teatro como seu verdadeiro lar, onde pode ser fiel à sua voz e aos seus ideais.
Com novos projetos em mente, como a produção da tragédia grega “Antígona”, o ator reafirma sua paixão pelas artes e a importância delas na vida das pessoas. “Uma cidade com tantos hospitais e farmácias revela um diagnóstico sombrio: o nosso povo sofre de doenças psicossociais, por falta das artes”, conclui, incentivando todos a buscarem mais conexões com a cultura. Confira a entrevista completa:
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O que mais te atraiu na peça “O Sonho Americano”?
Afastado dos trabalhos de palco por mais de 29 anos, durante os quais me ativei a produções e direções teatrais, já havia me desconectado de trabalhos como ator. Entendendo que o cenário artístico-cultural do Brasil estava estagnado em suas propostas há mais de 30 anos, mantive-me à distância de servir ao inócuo. Quando Luiz Carlos Checchia me apresentou o texto de sua autoria “O Sonho Americano” para conhecer, fiquei extasiado com a proposta escrita. Algum tempo depois, para meu espanto, ele convidou-me para participar do elenco da montagem. De pronto, sem pensar muito, aceitei. Mal sabia eu a fria em que estava me metendo. Explico: o que poderia fazer eu, um ator veterano e idoso, afastado do palco há tanto tempo, tendo com certeza adormecido técnica, memória, movimentos corporais etc.? Iriam me fazer conviver com um elenco jovem, dinâmico e sabidamente com novas técnicas e outras aprendizagens no campo da atuação, vindas de reconhecidas escolas profissionalizantes. Um grande desafio se apresentou em minha vida. Temeroso e incerto, resolvi aceitar tamanho desafio sem deixar de temer o fracasso; porém, a proposta do texto inspirou-me e determinou a minha aventura. No período de preparação da montagem, fui lentamente reconquistando a confiança, sempre com as benesses da equipe, principalmente da sabedoria e paciência do diretor. Não creio estar apresentando o melhor resultado de ator do planeta, mas, ao menos, sinto-me recompensado por não comprometer o trabalho cênico.
Como foi o processo de preparação para o seu personagem? Houve alguma pesquisa ou preparação específica?
O processo de preparação contou com a orientação do diretor, assim como com a minha obstinação em compreender os princípios de caráter e personalidade do personagem.
Você pode compartilhar um pouco sobre como é a dinâmica do seu personagem com os demais na peça, especialmente com Beatriz e Bento?
A dinâmica do personagem apresenta múltiplas facetas. Ele é um homem agressivo e de caráter duvidoso, mas também engraçado, com uma certa doçura, e sente prazer em torturar física e psicologicamente. Sua relação com o companheiro é paternal e de liderança. Com Beatriz, talvez encontre a projeção de uma filha, dada a sua afeição pela imaturidade presente na jovem.
A peça aborda temas delicados relacionados à ditadura militar. Como você lida com a responsabilidade de interpretar um papel que pode ter um impacto tão significativo sobre a audiência?
Interpreto o papel com prazer, compreendendo que, principalmente, os jovens precisam se impactar com o que foi a ditadura militar. Que meu personagem possa lhes transmitir a mensagem: DITADURA NUNCA MAIS!
Quais são suas expectativas para a recepção do público durante a temporada?
Que o público reflita sobre o que foi e o que pode chegar. Precisamos utilizar todos os meios de comunicação possíveis para impedir que o fascismo emerja, principalmente, por meio dos movimentos políticos-partidários.
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Você começou sua carreira na TV Tupi e depois transitou para o teatro e cinema. Como você avalia essas diferentes experiências e o que cada uma te ensinou?
Caminhei primeiramente do teatro para a televisão e, posteriormente, para o cinema. Sempre baseei meu trabalho no teatro em produções coletivas, comprometidas com as causas político-sociais. No teatro, sempre fui senhor da minha voz e da minha consciência. A televisão significou aceitar os trabalhos que surgissem, sem qualquer interferência. No cinema, o prazer em atuar era suficiente. São três linguagens diferentes de encenação: 42 filmes, 16 peças de teatro, 8 novelas e mais de 200 comerciais publicitários, que não definem a trajetória que tive no teatro.
Entre os filmes em que atuou, como “Tchau Amor” e “Os Pivetes de Katia”, qual foi o papel mais desafiador e por quê?
Dos meus 42 filmes realizados, não encontrei desafios propriamente ditos. Com a vasta experiência no teatro, precisei, apenas no início, entender a linguagem do cinema. Um filme, com o título apelativo “A Menina e o Estuprador”, no qual fiz o papel de um psicólogo, reputo como uma das minhas melhores performances. No mais, entre mortos e feridos, consegui me salvar.
Seu trabalho no teatro inclui peças de Nelson Rodrigues e Lauro Cesar Muniz. Como você acha que esses trabalhos influenciaram sua abordagem como ator?
Com elencos recheados de grandes atores e, como bom observador que sou, sempre permaneci atento aos ensinamentos que vinham de cada um deles, e isso foi de graça.
Você tem algum projeto futuro que esteja especialmente animado para compartilhar com os seus fãs?
Tenho um sonho: produzir e dirigir a tragédia grega “Antígona”, de Sófocles. Desejo criar uma montagem clássica voltada para um público de formação simples, que não está acostumado ao teatro. Um dia, farei isso!
Quais são os maiores desafios que você enfrenta como ator e como você os supera?
Como ator, busco textos com abordagens sociais e políticas que me satisfaçam e que justifiquem o tempo que dedico à minha vida.
Deixe uma mensagem para o público.
Que todas as pessoas busquem se servir, cada vez mais, das artes. Uma cidade que possui tantos hospitais, prontos-socorros, ambulatórios médicos, clínicas e farmácias nos traz um diagnóstico sombrio: o nosso povo sofre de doenças psicossociais por falta das artes.
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