Depois de sua estreia bem recebida com o álbum “Andarilho”, em 2015, Casaprima se consolida como duo no maduro novo disco, “Norte”. O folk, presente desde o início, ganha novos tons, indo da música brasileira ao indie, passando pelo uso de elementos eletrônicos pela primeira vez. Do agreste pernambucano de Caruaru, Casaprima canta os anseios e desejos, medos e inseguranças universais em doze canções que atestam sua evolução estética, musical e poética.
A nova fase de Casaprima vem sendo preparada desde 2017, quando se iniciou o processo de gravação desse disco. A partir do final de 2021, Heitor Alves (violão e voz) e Maria Juliana (piano e voz) anunciaram o retorno de seu projeto musical com um clipe que se despedia do álbum anterior e acenava para o próximo trabalho. A partir daí, vieram os singles “Maduro e Real”, “Eu Canto” e “Grão”, canções que exemplificam a temática das letras.
Ao longo de suas 12 canções, “Norte” faz um chamado a vislumbrar as paisagens em busca do que nos faz feliz, celebra os encontros e o Senhor do Tempo, procura direção diante das incertezas e canta nossa pequenez diante do universo. É nas dualidades, nas contradições, nos contrastes e nas similaridades das vozes de Maria e Heitor que Casaprima ganha força para traduzir em música sentimentos tão íntimos quanto universais.
Com um intervalo de praticamente quatro anos desde o primeiro álbum de vocês, o “Norte” chegou como um mix de novos estilos desde a música folk brasileira até o indie. Como consideram estar essa nova era do grupo?
[Heitor] – Em poucas palavras, eu diria que a gente saiu da fase de ser “músico cabeçudo”, que se preocupa demais em fazer algo tecnicamente e liricamente sofisticado, e hoje tem foco em fazer algo mais acessível e divertido, sem perder o foco em uma mensagem que enaltece as pessoas. O nosso termômetro hoje é fazer algo que a gente goste verdadeiramente de escutar! No primeiro disco eu adoro tocar tudo, mas só gosto de ouvir 3 ou 4 músicas. No álbum novo eu gosto de ouvir todas as faixas!
[Maria] – Para construirmos o disco Norte, tivemos que nos adaptar ao cenário de dupla. Precisamos descobrir como o nosso som funcionaria sendo executado apenas por duas pessoas. Foi um processo de muito amadurecimento e autoconhecimento. Nessa nova era, sinto que conseguimos transparecer quem são Heitor e Maria, nossos anseios, alegrias e dificuldades ao longo de nossa trajetória como músicos. Ele contém um pedacinho de cada um de nós.
Uma das inovações que foram percebidas nesse novo projeto, é a utilização de elementos eletrônicos nas músicas. Como foi feita essa inserção?
[Heitor] – A gente baixou um monte de plugin gratuito na internet e mixou bem para ficar com jeito de plugin pago! A ideia original era fazer isso com instrumentos de metal e corda usados em orquestra, mas depois de experimentar bastante, a gente resolveu chutar o pau da barraca e ir em um caminho sem tantas referências ou influências!
[Maria] – Precisávamos construir um som que se diferenciasse do nosso disco anterior, uma vez que não éramos mais uma banda. Pensamos em elementos que pudessem complementar as canções, que tinham como foco o voz e violão, porém que pudessem ser executados também ao vivo. Então, surgiu a ideia de mesclarmos o nosso som folk com elementos eletrônicos e acabamos gostando muito do resultado final.
O tema abordado em “Norte” é muito complexo, pois mexe com diversos sentimentos que estão ligados as inseguranças universais que passamos. O que os levaram a pensar na abordagem de tais temas e como é o processo criativo do grupo?
[Heitor] – Eu tento sempre escrever sobre coisas que eu sinto e acho que a beleza está no comum. Eu realmente amo quando as pessoas chegam até mim e dizem que o trecho “A” ou “B” de uma música minha é exatamente o que a pessoa sente, afinal, eu tento olhar para o comum, para situações que todos passamos, mas nem sempre costumamos conversar…
[Maria] – As canções que escrevo para a Casaprima falam muito de quem eu sou. Através delas, consigo externar sentimentos e pensamentos que, muitas vezes, geram identificação em outras pessoas. A inspiração surge, muitas vezes, de longas conversas que costumamos ter ou de momentos de introspecção. Juntos, vamos lapidando letras e arranjos, tentando sempre respeitar o espaço um do outro no processo criativo.
Realizando um balanço do Casaprima da estreia no primeiro álbum em 2015 até agora em “Norte”, o que acham que mais mudou na forma de pensar musicalmente de vocês e quais foram os sinais de que o novo projeto seria a escolha perfeita para mostrar isso?
[Heitor] – Como disse antes, eu deixei de ser tão cabeçudo… É coisa de adolecente que gosta de um estilo em detrimento de outro. Fica tentando escrever poesias muito difíceis no “tecniquês”, mas que no fundo, não tem nada a dizer. Eu enxergo que a música tem melhorar a gente, nos divertir, nos engrandecer, a música tem que exorcizar nossos demônios internos. Independente de ser funk, gospel, metal, pagode. Não importa! E quando eu assumi isso para minha vida eu senti que o trabalho da Casaprima, à sua maneira, deveria servir a mim mesmo, e aos outros. Quando penso em música, penso em servir.
[Maria] – Para mim, as maiores mudanças foram na autoconfiança e autoestima. No primeiro álbum eu não percebia todas as minhas capacidades e habilidades, acreditando que nunca poderia ser tão talentosa como os outros integrantes. E eles eram músicos maravilhosos. No processo de construção do disco Norte tive que lidar com minhas inseguranças e limitações e passei a acreditar mais no meu potencial enquanto artista, confiar mais em mim mesma e saber me impor na construção das canções, já que agora, éramos apenas nós dois.
O novo disco ficou em produção desde 2017 e logo depois teve o retorno de Heitor Alves e Maria Juliana ao Quais foram os pensamentos e desafios que cercaram o nascimento desse segundo álbum?
[Heitor] – Dinheiro. Lançar um disco é algo caro, complexo, imprevisível. Tem muito trabalho por trás da musiquinha bonita que você escuta na internet. Mas isso é trivial. O que realmente pesou (internamente) para mim foi ter que me reconectar com a música. Tem vezes na vida que a gente chega em um ponto onde as coisas perdem o sentido. A música teve um momento de névoa na minha cabeça entre 2018 à 2020… Foram 2 anos que eu não vi um sentido em continuar. Meu maior desafio interno foi me curar e me reconectar com meus propósitos musicais.
[Maria] – O maior desafio para mim foi aguardar que Heitor recuperasse sua vontade de fazer música. Durante um período de dois anos, a Casaprima ficou parada, enquanto cuidávamos de projetos pessoais e foi difícil lidar com o ímpeto de continuar produzindo música. Também tivemos momentos onde precisamos nos adaptar ao estilo de composição um do outro, aceitar nossas limitações enquanto músicos e artistas e respeitar o fato de que, apesar de sermos uma dupla, pensamos de forma diferente e nos expressamos de um jeito diferente.
Durante os últimos anos, a banda chegou a passar por várias reformulações pelo Apesar de todas essas transformações, a Casaprima continua mantendo a mesma essência com a qual começou na música?
[Heitor] – Para mim não! Antes eu colocava a audiência na minha frente e isso me deprimia muito. Hoje eu me coloco na frente. Antes a arte tinha que ser maior do que eu mesmo e honestamente, isso é um pensamento que me colocava em situações que não me deixavam feliz. Teve momentos que minha felicidade foi drenada de um jeito que eu não conseguia pegar no violão. Eu acho que eu cheguei a passar mais de 1 ano sem cantar… Não é que eu acredite que o artista é maior que a obra, pelo contrário… Eu acho que a obra se eterniza, mas isso é consequência do quanto tua obra atinge a vida das pessoas. Quando você está em um avião, a tripulação orienta os passageiros a colocar primeiro a máscara na mamãe (ou no papai), antes de colocar a máscara no filhinho, para que assim os pais tenham mais reação. eu tomo isso para minha vida. Eu tenho que estar feliz para a Casaprima continuar.
[Maria] – Nós mudamos. A Casaprima mudou e é natural que a essência do nosso trabalho mude também. Nosso amadurecimento e as novas experiências que vivemos transparecem na música que fazemos hoje. Acredito que as canções de Norte marcam uma fase muito importante para a Casaprima. Uma fase onde compreendemos quem somos nós e qual é a mensagem que desejamos passar para outras pessoas. Agora, mais do que antes, temos muita clareza sobre o som que fazemos e onde queremos chegar enquanto artistas.
Ao que acham que se deve o sucesso e a identificação do público com o grupo?
[Heitor] – Eu não acho que a gente tenha sucesso (mercadológico), ou público (suficiente para pagar boletos). A parte da identificação, na minha visão, tem muito haver com eu buscar falar sobre coisas do dia-a-dia de qualquer Mas a gente está melhorando nisso… E a forma como eu vejo essa melhora é estar compondo cada vez melhor, e principalmente, se vendo verdadeiramente nessas composições.
[Maria] – O público da Casaprima costuma nos dizer que se identifica com os assuntos cotidianos que abordamos em nossas canções. Também falam sobre se identificarem com as melodias e harmonias. Acredito que esta identificação surja porque somos um casal normal, como qualquer outro. Com momentos de felicidade, reflexão, companheirismo. Mas também com ansiedades, receios, inseguranças. Sentimentos tão comuns e inerentes que acabamos por externar através de nossas canções.
Além de “Norte”, que novas direções podemos esperar do Casaprima?
[Heitor] – Novas composições sempre. O artista que continua depois de 2 discos que não estouraram, continua porque ama o que faz, independente da aprovação alheia.
[Maria] – Não consigo me imaginar sem produzir arte de alguma forma. E continuamos compondo e nos preparando para um próximo disco em breve. O mercado da música atual está completamente diferente do que estávamos acostumados. Hoje, temos muito mais oportunidades e novas plataformas que nos permitem alcançar ainda mais pessoas e mostrar o nosso trabalho.
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