A escritora Ana Bisneto de Moura apresenta em Nas Asas da Coragem a trajetória de Maria de Lourdes, sua avó, como um símbolo das lutas e superações enfrentadas por mulheres brasileiras. A obra aborda temas como violência doméstica, desigualdade social e o papel da mulher na construção familiar, ao mesmo tempo em que intercala dados históricos e reflexões sobre a realidade do século passado.
Em entrevista, Ana revela que a coragem e o amor incondicional de Maria de Lourdes foram a inspiração para o livro. Durante o processo de pesquisa, a autora aprofundou-se na história familiar e na realidade das mulheres de sua época, destacando as dificuldades enfrentadas pela população feminina, especialmente as negras e pobres. Para Ana, essa narrativa busca não apenas emocionar, mas também conscientizar os leitores sobre as desigualdades ainda existentes.
Mais do que uma homenagem, Nas Asas da Coragem promove uma reflexão sobre a importância do respeito e da conexão entre gerações. A autora reforça que entender o passado é essencial para fortalecer os laços familiares e combater preconceitos, convidando o público a repensar suas relações e atitudes no ambiente doméstico. Confira a entrevista completa:
O que a inspirou a contar a história de Maria de Lourdes? Como foi o processo de pesquisa e escrita deste livro?
O que me inspirou foi sua coragem, fé, resiliência e amor pelos filhos. Quando eu defini escrever o livro, visitei minha família nas minhas férias que moram em outros estados e fui dialogando, buscando informações sobre ela desde sua infância com meus irmãos, irmãs e minha tia e descobri muitos fatos sobre ela que eu desconhecia e que me impactaram. Pesquisei também sobre a economia e políticas públicas da época para entender a situação de escassez que ela e sua família conviveram.
Você menciona que Nas Asas da Coragem é uma homenagem às mães que enfrentaram grandes desafios. Em que aspectos Dona Lourdes reflete as histórias dessas mulheres?
A sua trajetória de vida enfrentando desafios e superações, inclusive violência doméstica e escassez financeira parecida com a de milhares de mulheres brasileiras, porém é uma história única, que servirá de inspiração para muitas mulheres.
O livro toca em temas importantes, como casamentos arranjados, falta de métodos contraceptivos e a situação da saúde pública no Brasil do século passado. Como foi intercalar esses dados históricos com a narrativa pessoal de Maria de Lourdes?
Os dados históricos foram importantes e necessários para demonstrar que na época a situação das mulheres era ainda mais difícil porque eram dependentes dos pais ou do marido, sendo “dona de casa”. O acesso à saúde pública para as famílias que moravam na área rural era inexistente e as famílias eram grandes por falta de métodos contraceptivos. O uso da pílula anticoncepcional no Brasil ocorreu a partir de 1962 e não era acessível às famílias pobres.
Dona Lourdes enfrentou um casamento abusivo e decidiu seguir a vida sozinha com os filhos. Como você acredita que essa decisão impactou a forma como vemos o papel da mulher na sociedade brasileira?
Essa decisão demonstra que a mulher precisa ter coragem para tomar decisões em situações que a aflige, aniquila e a destroi. Atualmente, muitas mulheres têm a sua própria renda e políticas públicas de combate à violência doméstica, porém não é suficiente. A mulher tem um papel importante na sociedade em todas as áreas e de forma tímida vem ocupando espaços de decisões políticas.
Qual foi o momento mais marcante da trajetória de Dona Lourdes que você gostaria que os leitores se conectassem?
O momento em que ela deu um basta ao casamento abusivo e quando abriu mão de um novo casamento por amor ao seu filho, uma vez que o seu pretendente não aceitava o seu filho que ainda era pequeno do casamento anterior.
O livro também aborda o preconceito e as dificuldades que Maria de Lourdes enfrentou sendo uma mulher negra e pobre. Como você vê a evolução dessas questões hoje?
Houve pouca evolução, as mulheres negras e pobres continuam sendo discriminadas, tanto no mercado de trabalho, como no acesso à saúde e educação, além de serem mais acometidas por violência. A promoção da igualdade racial continua sendo um grande desafio.
Você acredita que contar histórias como a de Maria de Lourdes pode ajudar a estreitar os laços familiares e promover uma maior compreensão entre gerações?
Acredito! O livro narra também o relacionamento de Dona Lourdes com seus filhos e vice-versa, de cuidados, respeito, gratidão, servindo de exemplo para buscar a harmonia familiar que às vezes não existe. Ela deixou um grande legado aos filhos de princípios e valores que nortearam a vida de cada um, conforme depoimento no final do livro feito por cada filho. Além disso, o livro traz no final de cada capítulo algumas reflexões, intitulada “Praticar o amor é simples”, que vai contribuir para rever o relacionamento dos filhos com seus pais.
A sua formação em administração e cursos na área de inteligência emocional influenciaram de alguma forma sua escrita? Como você aplicou esses conhecimentos ao retratar a jornada emocional de Dona Lourdes?
A formação em administração trouxe-me conhecimentos intelectuais que agregado ao conhecimento emocional, a exemplo do curso de coaching me ajudou muito para ressignificar minhas crenças limitantes, identificar minha verdadeira identidade e o reconhecimento da minha capacidade. A emoção e a razão foram imprescindíveis para eu buscar, compreender e narrar a história de vida de Dona Lourdes sem me sentir vítima.
Qual foi a maior lição que você aprendeu ao escrever sobre a vida de Maria de Lourdes e como essa experiência impactou sua visão sobre as mulheres brasileiras?
Não devemos desistir dos nossos sonhos. Com coragem, amor, fé e resiliência é possível superar os desafios da vida. As mulheres brasileiras são guerreiras e continuam lutando contra a violência doméstica e a desigualdade. Existem muitas Donas Lourdes neste Brasil a fora. Atualmente as mulheres têm organizações e novas formas para defender seus direitos, além de leis de proteção, a exemplo da Lei Maria da Penha, porém não tem sido suficiente para diminuir os casos de feminicídios, seguindo com o lema: “Continuaremos em marcha até que todas sejam livres”.
O que você espera que os leitores levem consigo após a leitura de Nas Asas da Coragem? Há alguma mensagem específica que você gostaria de reforçar?
“A coragem não é a ausência do medo, mas sim a decisão de que algo é mais importante que o medo.” Ame seus pais. Nunca é tarde para começar. Não deixe para se arrepender e pedir perdão quando perder aqueles que ama.
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