Yvon Gaillard, economista e CEO da Dootax, fala sobre como os desafios da reforma tributária são significativos para os estados
Não há dúvida de que um dos principais problemas do sistema tributário brasileiro é o ICMS, e isso fica ainda mais evidente quando consideramos o ICMS-ST. Somente em São Paulo, por exemplo, o ICMS-ST arrecadou R$ 38,4 bilhões em 2021, representando quase 21% do total do ICMS arrecadado pelo estado, de acordo com um levantamento da Fiesp.
O ICMS-ST, sigla para Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – Substituição Tributária, é um imposto estadual que incide sobre a venda de determinados produtos. Já a substituição tributária é um mecanismo pelo qual a responsabilidade pelo recolhimento do tributo é transferida para um único contribuinte da cadeia de produção e comercialização, geralmente o fabricante, importador ou distribuidor. Isso significa que esse contribuinte é responsável por calcular e recolher o ICMS devido não apenas em sua própria operação, mas também nas futuras vendas do produto ao longo da cadeia.
O ICMS-ST visa simplificar e tornar mais eficiente a arrecadação do imposto para o governo, concentrando a responsabilidade em um único agente, embora isso possa complicar significativamente a vida do contribuinte.
A proposta recente de reforma tributária apresentada no Congresso tem como objetivo unificar o ICMS e outros impostos sobre o consumo, como PIS, COFINS, IPI e ISS, em um ou dois novos tributos (além de um tributo seletivo). Essa medida acabaria com o ICMS-ST, o que seria benéfico para os contribuintes, mas adiaria a receita para os estados.
Isso representa um desafio, uma vez que aproximadamente 20% de toda a receita de ICMS é proveniente do ICMS-ST. Essa receita não estaria disponível na mesma velocidade em que está hoje para os estados. Além disso, existem outras implicações, como a perda de receita potencial que os estados teriam devido à não efetivação das operações e à não solicitação de ressarcimento pelos contribuintes.
Para ilustrar esse cenário, vamos considerar um grande varejista de capital aberto: o Magalu, que teve um tempo médio de giro de estoque de 87 dias em 2022, de acordo com a divulgação de resultados da empresa. Isso significa que o governo receberia apenas a parcela relativa ao ICMS-ST desse contribuinte em média 87 dias após a venda da indústria para o varejista.
Levando em conta o período de apuração e pagamento no mês seguinte à realização da transação, o estado receberia, em resumo, 20% do IVA (ou IBS, sigla do novo imposto proposto) gerado pelo Magalu em até 120 dias após a operação. Embora esse impacto possa parecer pequeno do ponto de vista contábil, ele pode ter consequências expressivas no fluxo financeiro dos estados e em suas despesas correntes.
A reforma tributária, portanto, apresenta uma série de desafios para os estados, que precisarão encontrar soluções para lidar com uma potencial queda imediata de geração de caixa por causa da eliminação do ICMS-ST. Com isso, terão que realizar ajustes nas despesas, planejar cuidadosamente a transição e buscar negociações que não prejudiquem nem os próprios estados, nem os contribuintes envolvidos.
É essencial que os estados adotem uma abordagem estratégica e cautelosa ao enfrentar esses desafios. Eles precisam buscar alternativas para compensar a queda de geração de caixa, como a identificação de novas fontes de arrecadação ou otimização da gestão fiscal. Ao mesmo tempo, devem avaliar os impactos econômicos e sociais da transição, a fim de mitigar quaisquer efeitos negativos e garantir um processo justo para os contribuintes.
Além disso, é fundamental que se engajem em um diálogo construtivo com o governo federal e demais entidades envolvidas na elaboração e implementação da reforma tributária. Isso permitirá que apresentem suas preocupações e necessidades, buscando soluções equilibradas e que levem em consideração a realidade e as particularidades de cada região.
Em resumo, os desafios da reforma tributária são significativos para os estados, exigindo uma abordagem estratégica, planejamento cuidadoso e negociações efetivas. Somente por meio de uma gestão responsável e colaborativa será possível encontrar soluções que beneficiem tanto os estados quanto os contribuintes, garantindo uma transição suave e justa para o novo sistema tributário.
*Yvon Gaillard, cofundador e CEO da Dootax. Com mais de 15 anos de atuação no mercado, Yvon é um dos principais personagens na revolução do sistema fiscal do país. Economista formado pela FAAP e com MBA pela Business School São Paulo, liderou projetos em empresas como Gol Linhas Aéreas e Thomson Reuters.
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